segunda-feira, 9 de junho de 2025

A Questão do sentimento e o Respeito por si mesmo - XXIX

 


Entre Razões e Emoções: A teologia do amor que fica

Há músicas que não apenas nos tocam — elas nos despem por dentro. Como espelhos cruéis, revelam histórias que às vezes nem conseguimos colocar em palavras. “Razões e Emoções”, da banda NX Zero, é exatamente uma dessas. Uma oração desesperada de quem amou demais e não foi escolhido. Um grito contido, um apelo em forma de melodia, um amor que não coube no mundo real, mas que explodiu dentro da nossa alma.

“Dizer, o que eu posso dizer, se estou cantando agora pra você ouvir com outra pessoa...”

Essa frase nos corta fundo. O amor foi vivido, foi verdadeiro — mas não foi suficiente. Agora, só sobra a canção. Como se fosse o último respiro desse sentimento que não encontrou espaço. Como se cantar com dor fosse o único jeito de dizer aquilo que ficou preso, sufocado no momento certo.

Vemos histórias assim o tempo todo. Histórias que não acabam porque falta sentimento, mas porque alguém teve que escolher. Escolher entre o que é seguro e o que o coração pedia. O amor estava ali, vivo, pulsante, sincero — mas alguém preferiu voltar atrás. Por medo. Por conveniência. Por não ter coragem para romper com o que já conhece.

Quantas vezes isso acontece com a gente? 

Quantas vezes preferimos a segurança de uma relação que já não dá certo a nos jogar no risco de um amor que exige entrega total?

“É que às vezes acho que não sou o melhor pra você, mas às vezes acho que poderíamos ser o melhor pra nós dois...”

Isso dói demais. Um coração partido entre o medo e a fé. Entre a dúvida sobre nós mesmos e a esperança tola — ou talvez não tão tola assim — de que o amor inteiro poderia mudar tudo. E é justamente aí que mora o drama: quando há amor, mas falta coragem.

Vivemos num tempo em que a intensidade assusta. Nos apaixonamos, mas temos medo do que sentimos. Preferimos ficar em relações mornas do que nos entregarmos a um sentimento que mexe com tudo. Fugimos de um amor grande simplesmente porque não sabemos lidar com a alma exposta, vulnerável.

“Pois Deus não nos deu espírito de medo, mas de poder, amor e equilíbrio.” (2Tm 1,7)

Mas amar de verdade é justamente isso: romper com o confortável, enfrentar o desconhecido. Nem todos aguentam.

Então sobra a espera. Não aquela espera idealizada, romântica, mas uma espera silenciosa, quase involuntária. Uma espera que não está ali para que o outro volte, mas que carrega a ausência como se fosse presença.

“Entre razões e emoções, a saída é fazer valer a pena... se não agora, depois não importa... por você, posso esperar.”

Esse “posso esperar” se repete feito um eco triste dentro do peito de quem ficou. É a forma de dizer “ainda estou aqui”, mesmo quando tudo parece ter se calado.

A verdade é que quem parte nem sempre sai por falta de amor. Muitas vezes, sai porque não sabe amar. Ou porque não acredita que merece ser amado de verdade. E quem fica... fica tentando entender. Fica tentando engolir o silêncio, a ausência, o retrocesso do outro. Fica agarrado a um futuro que foi arrancado. E mesmo assim, mesmo ferido, quem fica sabe: tudo valeu a pena. Porque amou. Porque mergulhou. Porque foi real.

Temos visto gente que volta para antigos lugares não porque quer reencontrar, mas porque tem medo de seguir em frente. Que escolhe o conhecido, mesmo ferido, em vez de se lançar no desconhecido com quem poderia ser a história mais linda da vida. E quando isso acontece, não é só o amor que se frustra. É a esperança que se despedaça.

Mas mesmo diante da dor, da ruptura, da não-escolha, existe algo maior: a dignidade de quem amou de verdade. De quem não se escondeu com medo. De quem esperou o tempo que foi preciso, não para alimentar ilusão, mas porque sabia que sentimentos reais não desaparecem da noite para o dia.

 “A esperança não decepciona...” (Rm 5,5)

Se a história acabou, foi porque o outro não sustentou. Porque o outro voltou atrás. Porque escolheu o mais fácil.

E mesmo com o coração quebrado, seguimos. Não com raiva, não com amargura, mas com gratidão. Porque o amor vivido deixou marcas que nunca se apagam. Porque, mesmo doendo, foi lindo. Porque o que sentimos foi tão grande, tão profundo, que o fim não destruiu — só transformou em memória.

Amores impossíveis existem, sim. Mas o que os torna impossíveis quase nunca são as circunstâncias — são as fragilidades da gente. São as portas que fechamos por medo, as escolhas feitas por covardia. 

 “O amor nunca falha.” (1Cor 13,8)

E no fim, o que sobra é respirar fundo e continuar. Com a alma marcada, sim, mas o coração intacto. Porque amar nunca foi um erro. O erro não é amar — é fugir do amor por medo de viver. Porque amar, mesmo que doa, é um gesto que toca a eternidade.

Por tudo isso, essa música não é só uma canção. É o retrato silencioso do que muita gente vive por dentro. Uma prece cantada por quem ficou esperando, não por fraqueza, mas por fidelidade ao que sentiu. E mesmo que o outro tenha partido, o amor que ficou não morreu. Só mudou de lugar,  porque amar é sempre o primeiro passo para a eternidade que nos espera

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Prof. DNonato — Teólogo do Cotidiano, entre razões e emoções, a dignidade está em termos amado de verdade.

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