No dia 31 de outubro, muitos associam a data ao chamado Dia das Bruxas; porém, para os cristãos, trata-se da vigília da Festa de Todos os Santos, conhecida em inglês como All Hallow’s Eve. Essa vigília antecede a celebração litúrgica de Todos os Santos, comemorada no dia 1º de novembro, e é uma oportunidade de preparação espiritual, oração e reflexão sobre a santidade, a vida eterna e a comunhão dos fiéis com Deus.
A Igreja Católica recorda que o verdadeiro sentido da data não está em fantasias ou superstição, mas em honrar a memória dos santos e aspirar à santidade pessoal. Nas celebrações litúrgicas, a vigília inclui leituras bíblicas que nos inspiram à santidade, como Apocalipse 7,9-16, que descreve a multidão de todos os povos diante do trono de Deus, e Mateus 5,1-12, com as Bem-aventuranças, mostrando os caminhos do amor divino.
Historicamente, a data tem raízes na antiga cultura celta, que realizava o festival chamado Samhain, marcando o fim do ano agrícola e o início do inverno. Para os celtas, esse período representava a abertura da fronteira entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos, permitindo comunicação com ancestrais e espíritos. O Samhain era celebrado entre 31 de outubro e 1º de novembro, com rituais que incluíam oferendas, fogueiras, sacrifícios simbólicos e festas comunitárias. Algumas tradições narram que, nesse período, os mortos podiam sair de seus túmulos para pregar peças ou assumir lugares entre os vivos. Para se proteger, as casas eram decoradas com símbolos assustadores, como caveiras, máscaras e a famosa abóbora iluminada, que viria a se tornar o icônico Jack-o’-lantern do Halloween.
Com a invasão romana das Ilhas Britânicas, por volta de 46 d.C., as culturas celta e romana se fundiram. O culto druida foi progressivamente reprimido, e a religião celta quase desapareceu. No século II, o cristianismo já tinha ampla presença na região, e práticas como o Samhain começaram a ser vistas como pagãs. Para oferecer uma alternativa cristã, a Igreja instituiu a Festa de Todos os Santos, inicialmente celebrada em 13 de maio, durante o pontificado do Papa Gregório III, e posteriormente transferida para 1º de novembro, incorporando a véspera – All Hallow’s Eve – à tradição cristã de lembrança dos santos e preparatória para a memória dos fiéis defuntos, celebrada em 2 de novembro. Assim, a festa foi cristianizada, mantendo reverência à vida eterna e ao triunfo sobre a morte.
A tradição do Halloween chegou aos Estados Unidos com os imigrantes irlandeses, que mantinham antigos costumes do Samhain. Para afastar espíritos que vinham pregar peças, ofereciam doces às crianças fantasiadas de monstros e criaturas sobrenaturais. Esse costume popularizou-se rapidamente, incorporando elementos de entretenimento e cultura popular, como filmes de terror com Drácula, múmias e fantasmas.
No Brasil, o Halloween foi introduzido principalmente pelo cinema estadunidense e, posteriormente, por festas escolares e eventos urbanos. A festa popular concentra-se em fantasias, decorações temáticas e distribuição de doces, muitas vezes dissociada do sentido religioso original. Em algumas regiões, elementos de superstição ou lúdicos se misturam à celebração, tornando-a mais cultural do que espiritual.
Na América Hispânica, a véspera de Todos os Santos e o Dia de Todos os Fiéis Defuntos adquiriram características próprias, mesclando herança católica com tradições indígenas e africanas. Em países como México, Guatemala e Peru, surge o famoso Día de los Muertos, celebrado nos dias 1º e 2 de novembro. As famílias constroem altares com oferendas de comidas, flores (como a cempasúchil), velas, fotos e objetos que lembram os entes queridos falecidos. Ao contrário do Halloween norte-americano, o Día de los Muertos é uma celebração da memória dos mortos, repleta de alegria e respeito, enfatizando a comunhão entre vivos e falecidos.
O Halloween, portanto, não tem relação com bruxas ou mortos, mas nos remete à lembrança da vida, da santidade e da esperança cristã. O Apocalipse 7,9-16 descreve essa realidade de forma luminosa:
- “Depois disso, vi uma multidão imensa, que ninguém podia contar, gente de todas as nações, tribos, povos e línguas. Estavam de pé diante do trono e do Cordeiro; vestiam túnicas brancas e traziam palmas na mão. Todos proclamavam com voz forte: ‘A salvação pertence ao nosso Deus, que está sentado no trono, e ao Cordeiro’. E todos os anjos que estavam de pé, em volta do trono e dos Anciãos e dos quatro Seres vivos, prostraram-se, com o rosto por terra, diante do trono, e adoravam a Deus, dizendo: ‘Amém. O louvor, a glória e a sabedoria, a ação de graças, a honra, o poder e a força pertencem ao nosso Deus para sempre. Amém’. Então, um dos Anciãos falou comigo, perguntando: ‘Estes, que estão vestidos com túnicas brancas, quem são e de onde vieram?’ Eu respondi: ‘Tu é que sabes, meu senhor’. Ele então me disse: ‘Estes são os que vieram da grande tribulação. Lavaram e alvejaram as suas vestes no sangue do Cordeiro. Por isso, estão diante do trono de Deus e lhe prestam culto, dia e noite, no seu santuário. E aquele que está sentado no trono os abrigará na sua tenda. Nunca mais terão fome, nem sede. Nem os molestará o sol, nem algum calor ardente.’
Assim, a vigília de Todos os Santos nos convida à reflexão sobre a vida eterna, a santidade e a comunhão com Deus e os santos, lembrando que a verdadeira proteção e alegria não vêm de superstições ou amuletos, mas da fé, da memória dos justos e da esperança cristã. Celebrar o 31 de outubro dentro da tradição cristã é, portanto, uma oportunidade de oração, contemplação e preparação espiritual, recordando o chamado universal à santidade que Deus concede a todos os batizados.
DNonato



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