terça-feira, 4 de outubro de 2011

Luzes e reflexões.

O texto a abaixo esta publicado no jornal Caminhado da  Diocese de Nova Iguaçu e  uma belíssima reflexão sobre a nossa vocação de cristão. O padre que assina é  Pároco na cidade de Japeri, uma das mais pobres do Estado do  Rio de Janeiro.
 Daniel Nonato
           
Brasão Diocesano
Com todo o clero da Diocese, participei do retiro em Mendes. A minha primeira motivação era poder descansar da rotina e do barulho da praça de Engenheiro Pedreira. Mas com grata surpresa, o Bispo pregador, soube envolver todos nós com a força da Palavra vivida.  O momento mais alto para mim, foram os nossos seminaristas dando testemunho das missões que realizaram em Santarém, na Amazônia. Logo depois do testemunho, conversei com o Padre Fernando sobre a importância desta experiência e para nós, padres de mais idade, foi como respirar ar novo e ter certeza de que um novo sonho missionário está chegando na nossa Diocese.
Mapa da Diocese de N. Iguaçu.
Os seminaristas descreveram muita bem a realidade do povo da Amazônia que vive na pobreza, mas com alegria e dignidade: para eles não havia distâncias, nem problemas de transporte de barco ou a cavalo, de saúde, de saneamento básico e nem de água barrenta. E nas horas vagas, esticavam sua jornada para visitar umas poucas casas mais afastadas. Deu para perceber e sentir futuros padres encantados com a pessoa de Jesus, Sua missão, Seu desprendimento, Sua pobreza de Servidor. Em seguida fui levado a fazer uma avaliação, um confronto, uma revisão da minha vida. Fui me confrontando com todas as Comunidades de Engenheiro Pedreira, aquela porção de terra de Deus, confiada aos meus cuidados.
Eles tinham cada dia uma “tarefa” a cumprir para encontrar pessoas (como todo trabalhador tem seu trabalho determinado) e eu faço o que “eu gosto” ou que “eu acho” importante. E assim, depois de seis anos há muitas ruas que nem entrei nelas. Muitas pessoas frequentam a igreja e eu não sabemos bem onde moram, outras deixaram de frequentar e eu nunca as procurei... e aqui não precisa “barquinho” para entrar nas ruas de algumas favelinhas onde corre livre o esgoto ou andar de cavalo com água até o pescoço para ir às ruas com lama, ou subir pelas trilhas dos morros: bastaria um pouco de boa vontade. E o pior é que quando a gente chega num lugar mais complicado, te acolhem como um herói e santo e... com muita alegria. A visita semanal aos presídios (lá estão os ‘últimos”), às vezes me custa tanto, mas o espírito missionário dos leigos, me fortalece.
E pensei em muitos missionários e missionárias do nosso povo: jovens que para seu futuro, trabalham de dia e estudam de noite (e eu no seminário recebia quase tudo de graça e ainda éramos exigentes...). Há pessoas que pegam o trem todos os dias às 4ou 5 horas da manhã pelo pão de cada dia (é a eucaristia diária deles?) e voltam tardas horas, longe da família e dos filhos, e eu... falo com muito zelo do dízimo, de partilha de colaboração generosa... e cobro a participação nas missas, nas reuniões, nas atividades comunitárias... e não conheço bem seus problemas, não escuto seus dramas, não sei apreciar o heroísmo e santidade deles. E quando chove, colocam sacos plásticos nos pés e levam tudo na maior esportiva e eu ando de carro, tenho “meus direitos”. A grande maioria mora em casas humildes e muitas com telhado de amianto: um forno! E eu penso às vezes de colocar um ar condicionado, e moro numa das casas mais bonitas do bairro. Das torneiras sai água imprópria, barrenta, às vezes falta, e pegam “viroses” e eu tenho plano de saúde, roupa limpa e passada, comida a meu gosto, prestígio e dignidade, e meu salário limpo, e sou chamado de “servidor” de Deus e do povo.
Quando jovem me encantei com a pessoa de Jesus: pensava em segui-Lo com total dedicação e pobreza, hoje me questiono: procuro  o Tesouro .... ou me satisfaço com “chapeados”....

Pe. Jacinto Miconi

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