Mensagem da 61º Assembleia da CNBB
Vós sois todos irmãos e
irmãs (cf. Mateus 23,8)
Nós, bispos católicos do Brasil, iluminados
por Jesus Ressuscitado, com fé e
esperança, reunidos no Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, de 10 a
19 de abril na cidade de Aparecida, SP, para a 61ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil-CNBB, dirigimos esta mensagem a todo o povo brasileiro.
Na Assembleia, tivemos a
oportunidade de dialogar e refletir sobre anossa participação na missão da
Igreja e na sociedade. Foi um momento de comunhão e de valorização das nossas
diversidades. Reafirmamos e renovamos nossa opção radical e incondicional pela
defesa integral da vida que se manifesta em cada ser humano e em toda a Criação.
O tempo pascal nos impulsiona a renovar a esperança na certeza de que a morte foi e será sempre vencida. Os
tempos atribulados exigem coragem e paciência para crescermos na Amizade Social
(cf. Campanha da Fraternidade 2024). As
muitas dificuldades ajudam a construir uma atitude de resistência e resiliência na busca por uma
sociedade mais justa e fraterna, valores
fundamentais do Reino de Deus.
O passado recente nos ensina
que a busca de soluções para o Brasil passa necessariamente pelo diálogo e pelo
entendimento. Muito do que superamos
deveu-se à articulação entre agentes lúcidos e cidadãos compromissados com a vida, a democracia e o
país. As instituições brasileiras e a
sociedade civil são fundamentais nesse processo. Os três poderes da República são instados a viver o que preconiza
a Constituição. Independência e harmonia não são opções de momento, são deveres
permanentes e irrenunciáveis.
Na sociedade do diálogo, a
paz é um imperativo. O primeiro dom do Ressuscitado
foi de que a paz estivesse no nosso meio (cf. João 20,21). Papa Francisco
recorda que a paz, por ação da força “mansa e santa” dos que creem, deve ser buscada como forma de “se opor
ao ódio da guerra” (Papa Francisco, 1º.
de janeiro de 2024). Desejamos paz para os inúmeros países em guerra, cujas consequências são milhares de
mortes e milhões de deslocados e refugiados. Os gastos militares em 2023 foram
os mais altos desde a Segunda Guerra
Mundial, enquanto a fome cresceu e alcança parcela significativa da população mundial.
Acompanhamos com dor o
crescimento do crime, das milícias, do narcotráfico, da violência nas cidades e
no campo, do bullying, do vandalismo, do
racismo, do feminicídio, do tráfico humano e da exploração sexual de crianças, adolescentes e
vulneráveis; a realidade dos migrantes, do povo em situação de rua, da população
encarcerada nos desafia profundamente; a
corrupção, o nepotismo e o tráfico de influência violentam o país. Necessitamos construir a paz que nasce
da justiça (cf. Isaías 32,17). Esse
cenário de violência se agrava pela precarização do mundo do trabalho e a tragédia do desemprego. Por
ocasião da Festa do 1º de Maio, que se
aproxima, a Igreja, inspirada em São José Operário, se une solidariamente aos trabalhadores e
trabalhadoras nas suas memoráveis lutas por
condições dignas de vida e trabalho, bem como com aqueles que continuam enfrentando antigos e novos
problemas. Entendemos que o Brasil necessita
de um novo marco legal que garanta a prioridade do trabalho, do bem-estar humano e da geração de emprego e
renda, principalmente para os jovens.
Todos os segmentos da sociedade brasileira devem defender a vida na sua
integralidade e agir solidariamente em prol de um país economicamente humanizado, politicamente
democrático, socialmente justo e
ecologicamente sustentável.
Os extremos climáticos, em
forma de desastres naturais provocados pela
ganância e pelas formas equivocadas de ocupação do espaço urbano, sem planejamento
e sem respeito aos mais vulneráveis, são cada vez mais intensos. A necessária transição para energias
limpas deve respeitar os direitos das
comunidades ao território e à qualidade de vida. A Amazônia sofre! Os povos da
floresta, das matas e das águas que ali vivem
não podem mais ser sacrificados num modelo de exploração que não permite o bem
viver. Os outros biomas – cerrado, mata atlântica, caatinga, pampa, pantanal – igualmente importantes,
estão sob pressões cada vez mais difíceis
de serem revertidas. Enfim, toda a Casa Comum sofre com a destruição.
O Brasil receberá em 2025 a
Conferência das Partes da Convenção das Nações
Unidas sobre Mudanças de Clima, a COP 30, em Belém do Pará, que debaterá soluções para conter o aquecimento
global e criar alternativas sustentáveis
para a vida na Terra. Essa Conferência poderá ser uma oportunidade de mostrar o compromisso dos
governos com a obra da Criação e a
responsabilidade das mulheres e dos homens como cuidadores de tudo o que Deus criou e lhes confiou.
Os povos indígenas
brasileiros, prejudicados por séculos, enfrentam um dos maiores ataques de sua história, por meio
do Marco Temporal, que já foi declarado
pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como inconstitucional. Há necessidade de melhores políticas públicas na
ação concreta em defesa dos povos
originários e proteção às suas terras, especialmente no território Yanomami.
Fundamental na vida do
Brasil, passados sessenta anos do início da ditadura, a democracia ainda
precisa de cuidado. Depois do período de sistemáticos e ostensivos ataques, temos a
oportunidade de fortalecê-la nas eleições
municipais de 2024, através do voto consciente e livre. A consciência cívica deverá estar a serviço dos mais
profundos interesses do nosso povo, pois há exigências éticas para a realização do bem
comum. Por isso, os cristãos, leigos e
leigas, não podem “abdicar da participação na política” (Christifideles Laici, 42). Preocupa-nos que
extremismos, desprezando o projeto de
fraternidade social, façam do processo eleitoral um palco de intolerância e de ainda mais violência.
Continuamos atentos ao lugar
e ao espaço social ocupados pelos novos
meios de comunicação. O combate à desinformação, às mentiras e às fakenews que, frequentemente, usam também a
linguagem religiosa para justificar
interesses políticos e econômicos escusos, nos exige maior capacidade de enfrentamento e melhores mecanismos
para que não seja modificada a soberania
do voto. Como disse o Papa Francisco, a Inteligência Artificial corre o risco de ser rica em
técnica e pobre em humanidade (cf. Papa
Francisco, Mensagem dia mundial das Comunicações de 2024). A liberdade de expressão não pode estar a
serviço da divisão social. A própria democracia
é enfraquecida pelo ódio, o fundamentalismo e o populismo. Realistas diante dos
desafios, acreditamos nos sinais de esperança. Comunidades cristãs têm sido
exemplos de uma solidariedade concreta, amizade
e responsabilidade social. Submetidos às periferias sociais e existenciais, sem condições de enfrentar com
dignidade o cotidiano, muitos encontram
na comunidade a mão estendida que muitas vezes lhes falta do poder público. Somente a cultura do encontro
pode promover uma sociedade mais justa e
fraterna.
Peregrinos da esperança, em comunhão com a
Campanha da Fraternidade 2024, que
completa sessenta anos, conclamamos o povo brasileiro a somar forças na construção de uma
única família humana. Rumo ao Jubileu da
Esperança de 2025 e sob o manto protetor de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Mãe e Padroeira do
Brasil, invocamos a bênção
de Deus sobre todo o povo
brasileiro.
Aparecida, 16 de abril de
2024
Dom Jaime Spengler
Arcebispo da Arquidiocese de
Porto*)
Alegre - RS
Presidente da CNBB
Dom João Justino de Medeiros
Silva
Arcebispo da Arquidiocese de
Goiânia - GO
1º Vice-Presidente da CNBB
Dom Paulo Jackson Nóbrega
Arcebispo da Arquidiocese de
Olinda e Recife - PE
2º Vice-Presidente da CNBB
Dom Ricardo Hoepers
Bispo Auxiliar da
Arquidiocese de
Brasília - DF
Secretário-Geral da CNBB
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