Essa denúncia ganha maior sentido quando olhamos para o chamado “tarifaço” de Donald Trump, que, a partir de 1º de agosto de 2025, impõe uma tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos. Essa medida, anunciada com a clara motivação de defender Jair Bolsonaro, acusado de tentativa de golpe, é uma ameaça direta à economia brasileira e à soberania nacional. Trump, em sua carta pública no X e em declarações recentes, deixou explícito que essa escalada tarifária serve para pressionar o governo Lula e proteger seus aliados políticos no Brasil.
O impacto econômico já é sentido na inflação dos preços básicos: a cesta básica aumentou em 15% nos últimos seis meses, o gás de cozinha subiu 25% e a energia elétrica 18%, elevando o custo de vida e aprofundando a pobreza das camadas mais vulneráveis. Esse “tarifaço” lembra o verso de Cazuza: “Brasil, mostra tua cara”. A cara que se mostra é a de um país vulnerável, exposto às chantagens internacionais e ao jogo político sujo que sacrifica a população para manter privilégios. É a face de um Brasil cuja economia depende da exportação, mas que é punido por sua resistência democrática. Enquanto isso, Bolsonaro e sua base celebram um patriotismo de fachada, incapaz de proteger o povo e que apenas reproduz o ciclo da exclusão e do sofrimento.
Essa mesma lógica do “nacionalismo” falacioso e protecionista foi importada para o Brasil pelo bolsonarismo, que com um discurso de “Brasil acima de tudo” promoveu um “tarifaço social” que atingiu brutalmente a população mais vulnerável: alta de preços no gás, na energia e nos alimentos, enquanto desmontava o Estado e entregava os setores estratégicos ao capital especulativo.
O bolsonarismo revelou-se uma aliança perversa entre o agronegócio predatório, milícias digitais, setores golpistas e lideranças religiosas fundamentalistas, que instrumentalizaram a fé para legitimar o autoritarismo e o ódio. Essa aliança não é um mero acidente: é o projeto consciente de uma teocracia autoritária, onde o moralismo hipócrita se transforma em ferramenta de dominação. O patriotismo, que deveria ser amor ao povo e à justiça, virou máscara para a necropolítica — política da morte que silencia diante da fome, da destruição da Amazônia e da violência contra os jovens negros e pobres.
Aqui entra a crítica bíblica profunda, que denuncia a hipocrisia do falso culto: Isaías alerta com veemência que Deus não quer “jejum em que o homem se aflige, inclina a cabeça como junco e se deita sobre cilícios e cinzas” se não vier acompanhado da justiça social, da defesa dos oprimidos e da promoção do direito (Isaías 58). Amós condena os que “pisam os pobres no pó da terra” e “arruinam o destino dos humildes” enquanto entoam louvores vazios (Amós 5). Jesus confrontou duramente os fariseus, denunciando sua religiosidade hipócrita que “fecham o reino dos céus diante dos homens” e vivem a “explorar os indefesos” (Mateus 23). Essa tradição profética é a base para entender a rejeição da religião vazia e do moralismo instrumentalizado pelo bolsonarismo.
A tentativa explícita de golpe em 2022 escancarou o caráter golpista desse projeto. A existência comprovada da Abin paralela — um órgão clandestino usado para perseguir adversários políticos e manipular informações — demonstra o grau de aparelhamento e subversão institucional. Isso ocorreu com a cumplicidade de setores militares, empresariais e religiosos, que apoiaram a tentativa de destruir a democracia brasileira e impor um regime autoritário disfarçado de cristianismo. Mais recentemente, na primeira semana de julho de 2025, o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump publicou uma carta em sua conta no X (antigo Twitter) em defesa explícita de Jair Bolsonaro, atacando o governo Lula e questionando sua legitimidade. Essa manifestação pública internacionaliza o golpismo brasileiro, revelando que o bolsonarismo não é um fenômeno isolado, mas parte de uma rede global de extrema-direita que busca minar democracias e impulsionar agendas autoritárias em vários países. Essa aliança internacional fortalece os setores que tentam manter Bolsonaro relevante e desestabilizar o Brasil democraticamente eleito.
É preciso esclarecer o que é o comunismo histórico e o que é o “comunismo da mente louca” vendido pela extrema direita. O comunismo real nasceu da crítica racional à exploração capitalista e propôs a construção de uma sociedade sem classes, fundamentada na justiça social. Apesar dos erros históricos de regimes autoritários, foi um projeto político concreto e teorizado. Já o comunismo da extrema direita é uma invenção delirante, que mistura qualquer forma de contestação ou luta por direitos com um inimigo imaginário. Basta discordar de Bolsonaro para ser tachado de comunista — como ocorreu com a Rede Globo, Sérgio Moro, Alexandre Frota e tantos outros.
Esse rótulo serve para criminalizar o pensamento crítico, sufocar o debate e justificar perseguições políticas. É o novo inquisidor digital e real, que ataca a educação pública, a ciência, a cultura e a solidariedade. É a versão tropical do fascismo, que usa a fé como arma para espalhar o ódio.
A festa pobre que Cazuza denunciou segue presente, mas agora institucionalizada como política de Estado. O bolsonarismo transformou o país em palco para um espetáculo de morte, intolerância e desinformação. A Constituição é rasgada, a democracia ameaçada, e a fé usada como cortina de fumaça.
A crítica ao clericalismo não pode ser esquecida. O bolsonarismo soube articular com setores religiosos — pastores, bispos e líderes — que instrumentalizaram a fé para vender prosperidade vazia, legitimar a violência e alimentar o ódio contra minorias. Essa religião de fachada desfigura o Evangelho libertador, traindo a missão profética de justiça e paz.
Mas não há profecia sem esperança. O Evangelho nos chama a denunciar os falsos profetas, a enfrentar os poderes opressores e a anunciar a justiça do Reino de Deus. Como Jesus que confrontou os fariseus hipócritas, somos convocados a romper com as falsas religiões que legitimam a opressão.
A resistência existe e é plural: movimentos sociais, indígenas, jovens das periferias, artistas, intelectuais e tantas vozes que negam o silêncio e lutam por um Brasil livre. Eles são a verdadeira face do país que Cazuza desejava — um Brasil que conhece a verdade e, por isso, se liberta.
Não podemos esquecer que a liberdade e a democracia exigem luta diária. É tempo de resistência ativa, de engajamento na defesa dos direitos, da educação pública, da justiça social e da solidariedade. A fé autêntica se traduz em compromisso com a vida plena para todos.
Fechamos com as palavras fortes do presidente Lula, ditas em março de 2025 durante a inauguração do Hospital Universitário do Ceará:
“Esse país não tem dono. O dono do país é o povo brasileiro. E quanto melhor estiver o povo, melhor estará o Brasil.”
Que essa verdade nos inspire a continuar a luta contra o bolsonarismo, o fascismo e a religião vazia, em defesa de um Brasil justo, solidário e soberano.
DNonato – Teólogo do Cotidiano
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